11 de mai. de 2013

Enconderijo


Entrei no armário e me escondi. Eu sou mesmo uma criança muito boba. É claro que o primeiro lugar que eles vão me procurar é no armário. Mas isso só quando eles pararem de gritar um com o outro. Eles sempre fazem isso. Toda noite. É sagrado, parece religião. Só que essa é uma religião que não prega paz ou amor ao próximo. É sempre sobre o melhor, quem comete mais erros, que sempre faz tudo errado, quem nunca se importou o bastante e por aí vai até quase de madrugada, quando eles cansam. Mesmo depois de tudo isso, eles ainda deitam na mesma cama, um pro lado, emburrado, e o outro com a cara fechada encarando a janela.

Não sei como eles conseguem viver assim. Não, isso não é de hoje. Faz um tempo que não saímos pra ver um filme ou andar no parque. O máximo que acontece é nós irmos à casa da vovó nos domingos em que eles não inventam a desculpa de que estão muito atarefados.

Eles pensam que eu não sei o que está acontecendo, mas aposto que inclusive o bairro inteiro deve saber. No começo era horrível, uma das piores coisas da minha vida. Mas hoje eu só vou pra outro armário lugar. Vovó uma vez me disse que as pessoas se acostumam com tudo na vida. Ela tinha razão, não vou mais duvidar dela. Quem sabe, na próxima vez que eu for almoçar na casa dela, a vovó não consiga me explicar porque mamãe e papai não param de brigar de uma vez e tentam ser felizes de outro jeito.

Photo: weheartit

2 comentários:

Nati Pereira disse...

Me escondi dentro de mim mesma e nunca mais consegui sair. Beijos

Jéssica Trabuco disse...

E o armário as vezes nos faz mais seguros. Mas onde fica a felicidade? Presa ou livre?